quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Quando chovem coelhos ou Quando um palhaço morre ou Tá vendo aquela estrela? II.

Na semana que passou, flutuei com as painas das tantas paineiras, por alguns muitos minutos, num breve passeio de tarde pelo bairro Flamboyant, em Campinas, minha nova morada, pelos próximos anos. Eu vi chover coelhos...

As paineiras, floridas ou despindo-se de seus flocos branquinho-amarelados, são lindas. Parecem fazer chover coelhos pequeninos, e eu, que depois de adultecer, sempre encontro coelhos por aí, como se fosse comum ver coelhos andando nas calçadas urbanas, fico a imaginar, será que um dia fui Alice? Será que sou? Porque raios tantos coelhos me atravessam o caminho?

Um dia, quando da primeira visita ao meu pai, no hospital, sentei sob uma grande paineira de fronte à entrada e ao som de um breve suspiro, ela ofertou-me uma pluma de si, a maciez repousou sobre meu colo tão serenamente na brisa daquela tarde, desde então me apaixonei pelas painas e flores que se jogam ao léu.

E quando me pousam as painas, revivem também os pequenos campos com dentes-de-leão, que encontrava nos caminhos da infância, antes em forma de flor, com suas finas pétalas aos montes, amarelas, depois, com suas sementinhas peludas planando no vento, no sopro do meu respirar. Não tenho mais visto os esvoaçantes destes-de-leão, em alguns lugares, se diz deles esperançaabre as janelas e deixa a esperança entrar na tua casa trazida pelo vento da tarde.

Não tenho visto mais as tais esperancinhas a voar, só posso pensar, que se tornaram os coelhos dos meus novos caminhos. Desde o dia em que decidi e em alto e bom tom proclamei: nada de esperar, quem tem esperança, nunca alcança. Alcança quem age e vai à labuta...De lá pra cá os coelhos sempre estão, me fazem vistas alegres, leveza imperante, sorriso no rosto, um desejo consistente de continuar, não como a tartaruga em seu duro casco e passo penoso, mas como as levadas lebres que correm quando podem e pausam quando querem.

Tem no mundo as tartarugas, muitas delas, dessas que se vangloriam por carregar o casco nas costas, o peso do mundo e a lentidão do penar, dos longos anos a caminhar, sentem o universo desde dentro, fundo enraizado. Com elas, as tartarugas, aprendo a colocar os pés no chão, sentir as raízes do tempo que foi. Já com as lebres, as painas e os dentes-de-leão, aprendo a manter as asas no céu, visando os brotos do tempos que virão.

Da segunda vez que visitei papai no hospital, isso foi em setembro de 1995, mês em que as painas se jogam ao léu, foi a última vez, não havia paineira, nem lebre, nem brisa com sementes voadoras, havia um silêncio triste e imenso. Houve um último olhar, um último sorriso, o último aconchego de um amor que não se acaba e um fim. 

Houve depois, um vazio doloroso, amansado por um vento intenso e uma garoa leve. Houve abraço apertado, choro compartilhado, cafuné redobrado, maturidade, um renovar de todas as relações, compreenção...houve aprender a dizer eu te amo...e depois de um tempo, que por aqui durou um ano ou dois, tempo de estar refeito o coração, há, desde então, sempre brisa, sempre leveza, sempre sorrisos voadores, silêncios saborosos, alegria sincera, amigos constantes e amores eternos.

Quando as paineiras chovem pequenos coelhos, é isso tudo e tantas coisas, outras, que minha memória revive, intensifico o motivo pelo qual a felicidade vive pairando em mim...por viver plenamente, hoje. AGORA é sempre o momento melhor.


Pai, tá vendo aquela estrela? Eu já consigo ver além...
























Tarde de 02 de setembro de 2010. Flamboyant, Campinas



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